Thiago Badaró

Condômino inadimplente em assembleia e a novação da dívida

A polêmica do condômino inadimplente, mas com acordo, estar na assembleia tem duas vertentes diferentes, mas ambas partem do conceito de novação das taxas em aberto

Por Thiago Badaró*

04/05/23 01:22 - Atualizado há 1 ano


A assembleia condominial é um dos institutos mais importantes da vida em condomínio, pois é nela que os condôminos podem debater e votar questões importantes, além de acompanhar o trabalho feito pelo síndico, por meio das prestações de contas.

considerado, por lei, um direito do condômino.

A assembleia é, de fato, um dos ápices da vida em condomínio e para participar desse momento tão importante, o novo Código Civil diz o seguinte: 

estando quite”. 

condômino inadimplente não tem direito de participar das assembleias gerais, sejam elas ordinárias ou extraordinárias, mas a pergunta que fica:

O condômino com acordo pode votar? Como fica a situação de condôminos que estavam inadimplentes, mas fizeram acordo com o condomínio e estão pagando as cotas em atraso? Estes condôminos são considerados adimplentes ou inadimplentes para efeito de votação em assembleia? 

Esse é um tema polêmico nos condomínios, pois o Código Civil não traz uma disposição específica sobre isso e, nesse caso, há uma grande discussão que divide os profissionais do Direito em duas correntes.

Dois entendimentos em relação à participação de condômino inadimplente em assembleia

não o considerar mais inadimplentesituação semelhante a uma compra parcelada.

em dia com o pagamento das parcelas, ele não é considerado inadimplente.

mesmo que não tenha quitado a dívida integralmente, já que existem parcelas vincendas do acordo, ele está quite com o condomínio e possui direito a voto.

argumento utilizado é o instituto da novaçãotransformação da dívida em outra, com a extinção da obrigação inicial, conforme previsão no art. 360 do Código Civil.

acordo não descaracteriza a inadimplênciadébito só será extinto quando houver a quitação total do acordo. 

Sendo assim, enquanto existir parcelas sendo pagas, o condômino não estará quite com a sua cota condominial, o que não o possibilita participar das votações em assembleia.

Lembramos que a previsão orçamentária, realizada anualmente pelo síndico, determina que o morador é obrigado a pagar, na data prevista na convenção, a cota proporcional à fração da sua unidade, na sua integralidade.

estendeu aquela pendência para um prazo maiorcomposição da taxa que lhe compete não foi integralmente recolocada nos caixas do condomínio, mantendo-se o “buraco” na composição orçamentária daquele mês, não fazendo com que o condômino ficasse quite com a taxa condominial. Nesse sentido podemos realizar alguns apontamentos.

Significado de estar quite e o conceito de novação de dívida

livre de dívida, de obrigação.

não está livre da dívida, mesmo que a substitua por outra, pois nele, com a devida correção monetária, multa, juros e (em alguns casos) custas, recebeu um novo vencimento, mas não quitou a obrigação principal contraída.

Ele continua obrigado à pagá-la até o final, ou seja, somente com o pagamento da última parcela o condômino supriu a lacuna que deixou pelo não pagamento da sua proporcionalidade no mês de inadimplência.

novação da dívida seja efetivanova obrigação contraída deverá ser mudada de forma substancial, e não somente por alterações secundárias, como mudança de prazo de pagamento.

contraria a premissa da novação.

Decisão judicial recente sobre participação de condômino inadimplente em assembleia

simples parcelamento de uma dívida não significa que esta foi novada automaticamente, como pode ser visto em decisão publicada em 2022:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – DESPESAS CONDOMINIAIS – NOVAÇÃO – INOCORRÊNCIA – Mero parcelamento de dívida não implica em ânimo de novar – Acordo firmado entre um dos executados e o condomínio que não constitui alteração substancial da dívida e tampouco exime a responsabilidade dos proprietários frente ao débito cobrado – Execução, no entanto, que deve prosseguir em face da agravante apenas com base no valor originário da execução, excluída a multa de 30% por descumprimento da avença – RECURSO PROVIDO EM PARTE. 

 (TJSP;  Agravo de Instrumento 2278941-14.2021.8.26.0000; Relator (a): Luis Fernando Nishi; Órgão Julgador: 32ª Câmara de Direito Privado; Foro de Presidente Prudente - 5ª Vara Cível; Data do Julgamento: 10/03/2022; Data de Registro: 10/03/2022)

Isso ocorre porque o próprio código é claro em determinar que a dívida nova substitui e, concomitantemente,  extingue a anterior o que não acontece na realidade dos condomínios, vejamos o que diz o inciso primeiro do art. 360, I do Código Civil:

Art. 360. Dá-se a novação:

 I - quando o devedor contrai com o credor nova dívida para extinguir e substituir a anterior;

(g.n) 

 Ainda avaliando a situação por outro prisma, digamos que o morador consiga realizar uma novação efetiva da dívida condominial, inclusive com o condomínio concedendo o comprovante de quitação sobre a dívida daquele mês específico que ficou em aberto, porém com nova a obrigação sendo devida em parcelas.

código não especifica qual obrigação deverá ser quitada para que o morador participe da assembleia, devendo a avaliação desse caso ser geral, ou seja qualquer obrigação em aberto com o condomínio, não permite o direito de participação ou voto do morador. 

Art. 1.335. São direitos do condômino:

 III - votar nas deliberações da assembleia e delas participar, estando quite.

(g.n)

Sendo assim, mesmo que a questão seja polêmica o Código Civil não dá margens para interpretações diversas das trazidas acima, logo, qualquer obrigação contraída com o condomínio e não quitada impedirá o morador de participar e votar nas assembleias condominiais.

(*) Thiago Badaró é advogado, com atuação voltada à área condominial, pós-graduado em Direito Tributário, processual civil, imobiliário e contratual, professor de direito condominial na Escola Superior de Advocacia (ESA-OAB/SP) e professor de Direito Imobiliário em cursos de pós-graduação de algumas universidades, palestrante e escritor de artigos. Contato: thbadaro@nardesbadaro.adv.br.