29/04/25 09:28 - Atualizado há 6 h
Mediar a convivência entre pessoas com perfis diferentes demanda do síndico um jogo de cintura que poucos profissionais de outras áreas têm. Em tempos de cultura individualista, então, essa habilidade se torna obrigatória.
Não faltam conflitos, nem aquele grupinho de moradores que faz valer os interesses da minoria na base da intimidação, muitas vezes do grito.
Por falta de vozes para se opor às propostas que vão contra a coletividade, os maus condôminos ganham força e vão minando a gestão, por mais bem-intencionado que seja o síndico.
Condôminos omissos deixam o síndico “queimar na fogueira” da minoria tóxica e, mesmo se autointitulando “pessoas do bem”, permitem que coisas ruins aconteçam no condomínio.
São moradores que fogem da responsabilidade e do compromisso com a maioria, e é sobre eles que vamos falar nesta matéria. Você vai entender o que leva o morador de condomínio a esse comportamento e porque é tão importante combatê-lo.
Um condomínio é um microcosmo que reflete um pouco do que é viver em sociedade, com todas suas maravilhas e, no limite, aberrações. Sendo assim, podemos esperar infinitas nuances de tipos e personalidades de moradores de condomínio.
De maneira geral, há sempre o reclamão de plantão, aquele morador que acha tudo ruim, mas nunca sugere algo para melhorar. Tipo “não comi e não gostei”. Como ele, o condômino fofoqueiro pode atrapalhar muito a paz no condomínio. Infelizmente, são tipos comuns no dia a dia do condomínio.
Juntos, reclamões e fofoqueiros acabam por fortalecer o grupo dos maus condôminos, que pensam exclusivamente nos seus interesses - mesmo que possam prejudicar a maioria.
“São pessoas pautadas na sua individualidade. Não querem saber, por exemplo, se no condomínio tem mais crianças e se preocupar com os espaços de brincar. Vão atrás dos seus interesses e ignoram a coletividade”, descreve a psicóloga Wanda Sanches Peters.
Em contraposição, o condômino colaborativo é o grande respaldo da boa gestão, pois está sempre disposto a fazer algo pelo bem comum. Traz sugestões, se dispõe a ajudar o síndico, facilita movimentos positivos com os funcionários e entre os vizinhos.
Fazendo coro com o colaborativo, o morador de boa paz é aquele que têm boa convivência, não falta nas assembleias, opina e fortalece as decisões que promovem melhorias para o condomínio. É o oposto do condômino omisso, que não participa das discussões de temas fundamentais, não aparece nas assembleias, se submete a arbitrariedades, desrespeito e situações inaceitáveis na vida em condomínio.
Às vezes, por falta de coragem de enfrentar um bate-boca, medo de retaliação por parte de vizinhos truculentos, inadimplência ou puro comodismo, podem ser muitas as razões que tornam um morador omisso.
“Tem muito morador que até quer o bem do condomínio, mas desiste de participar porque não tem paciência para discutir com quem só reclama e nunca propõe nada. E esse silêncio, essa ausência, acaba dando palco para a oposição crescer. Mesmo entregando um trabalho incrível, o síndico começa a se desmotivar. Já ouvi muito: ‘Poxa, eu gostava da sua gestão, mas não deu pra ir na reunião’, ou ‘Nossa, agora que saiu é que vi o quanto fazia falta’. Honestamente, é bem desgastante”, desabafa Pâmela Brusco, síndica profissional.
Pâmela não gosta de rotular ninguém como "bom" ou "mau" morador. Cada pessoa tem seu tempo, sua rotina, seus motivos. Às vezes, o silêncio vem de não se sentir acolhido ou de achar que sua opinião não faz diferença.
Uma razão que também deve ser considerada, destaca a psicóloga, é a pessoa que não quer arrumar qualquer conflito no condomínio por temer se tornar aversivo para ela e sua família.
“Vários moradores me falaram desse sentimento. Eles têm trabalho, um monte de situações e cenários desafiadores no dia a dia. Consideram a casa seu único refúgio. Não querem conflito no único lugar onde sentem paz e não querem ter embates com pessoas com uma disposição e energia muito mais bravia. Então, preferem ter um relacionamento no mínimo neutro nos cenários de discussão”, relata Wanda.
Numa assembleia importante para o futuro do condomínio, que exige voto da maioria, cada voz conta para a aprovação final. A não participação pode derrubar propostas benéficas e trazer prejuízos de diversas naturezas, incluindo segurança e saúde financeira do condomínio.
“Cada dia mais pessoas estão vivendo em condomínios e a falta de envolvimento de todos já tem trazido maus resultados. Mas esses desfechos não ocorrem do dia para a noite. Há por trás disso um histórico de abusos, postura antissocial e situações que não foram tratadas adequadamente, pois a ação isolada do síndico ou da gestão na aplicação do que consta previsto no regulamento e convenção condominial não são suficientes contra quem não tem limites. É necessário um posicionamento massivo dos condôminos, mantendo a prática de zero tolerância à violência e desrespeito”, analisa Keila Silva, síndica profissional.
As consequências da omissão de condôminos são graves e englobam gestão centralizada e ineficaz, conflitos entre síndicos e conselheiros, ambiente hostil e desgastante a todos, a problema de relacionamento entre vizinhos.
A lista não para e, conforme Keila, revela muitos casos de desvio de recursos financeiros, fraudes, embates judiciais com casos graves de desentendimento, agressão, até morte.
Isso tem vitimado muitos síndicos e gestores, adoecido muitos outros e tirado muitos bons profissionais do mercado, que desistem por priorizar sua segurança, saúde e vida.
“Do meu ponto de vista, sim, o condômino que se omite é tão ruim quanto o morador que se comporta mal. Ele está sendo conivente praticando sua omissão. E a conta chega”, afirma Keila.
Já nos condomínios onde se percebe maior envolvimento dos condôminos com foco no bem comum, há um debate mais enriquecido e gestão mais compartilhada, nível de consciência mais claro dos moradores sobre a gestão e as questões do condomínio.
Isso só contribui para a harmonia entre vizinhos, a segurança na gestão e a valorização do empreendimento.
Nestes condomínios, há prazer na gestão e bons profissionais têm maior interesse em atuar e fazer uma entrega de excelência. Todos só têm a ganhar com isso. Quando os moradores se posicionam, a gestão ganha força.
“Todo mundo mora ali, vive o dia a dia do prédio, então nada mais justo do que participar das decisões. Participar é cuidar do lugar onde a gente vive! Por isso, é papel da gestão criar espaços mais leves e receptivos para que todos se sintam confortáveis em participar”, resume Pâmela.
Isso aconteceu com dois condôminos, que viraram a chave no comportamento e se tornaram aliados da gestão da síndica.
Ela conta: “Um deles era o famoso 'reclamão de plantão'. Estava sempre insatisfeito, mas nunca aparecia nas reuniões. Um dia, o convidei para ajudar numa comissão de melhorias. Ele se empolgou, se sentiu útil, valorizado, e virou parceiro total da gestão, um subsíndico. O outro era super na dele, omisso mesmo. Quando comecei a mandar comunicados mais objetivos, com uma linguagem leve e direta, ele começou a responder e a dar sugestões. Hoje, é engajado e ajuda até a convencer os vizinhos a também participarem”.
Podemos concluir que um dos segredos para acordar um condômino omisso está na comunicação próxima, clara e empática. Chamá-lo pelo nome, mostrar que a sua opinião faz falta e que o condomínio é uma construção coletiva.
Outro ponto é mostrar como estar presente nas decisões impacta no bolso, na segurança, na convivência. E tudo com leveza!
Às vezes, um convite bem colocado no grupo do prédio vale mais do que dez convocações formais para assembleia.
Para envolver o máximo de condôminos possível, uma sugestão é promover ações junto à coletividade, viabilizando feiras, palestras, workshops, atividades coletivas e eventos de diferentes temas que despertem o interesse de diferentes pessoas. Mas é fundamental manter constância até que haja adesão ao envolvimento e o ambiente seja transformado.
Da parte do síndico, cabe também a autocrítica, pois a gestão é uma via de mão dupla.
“Às vezes, o síndico está tentando tanto resolver as coisas, que esquece de abrir espaço para o diálogo. Vale se perguntar: será que estou me comunicando da melhor forma? Estou acessível? Estou ouvindo mais do que falando? Transparência, empatia e escuta ativa fazem milagres. E quando o morador sente que sua voz é ouvida, ele vem — e vem para somar”, orienta Pâmela Brusco.
Muito tem se falado de cultura nas empresas e os condomínios precisam definir sua cultura de forma intencional também. Caso contrário ela será instalada pelos mais barulhentos sobre os omissos.
Trazer essa ciência aos moradores é uma responsabilidade da gestão. Nesse sentido, a pergunta a ser feita aos condôminos é: como é o condomínio onde vocês querem viver? E em resposta a isso, definir qual cultura é necessário implementar para que esse desejo se torne uma realidade.
Keila Silva explica que isso vai muito além do regulamento interno:
“São os combináveis mesmo quanto ao que é desejável, ideal, suportável e inadmissível. Não é fácil, é desafiador e precisamos ser francos com relação a isso. Mas esse movimento precisa ser iniciado se o síndico quer ter resultados concretos naquele condomínio.”
Infelizmente, situações conflitantes provocadas por maus condôminos são cada vez mais comuns no universo condominial, principalmente no dia a dia do síndico. O imediatismo, a intolerância, o egoísmo, o fácil acesso à informação dão a eles uma falsa sensação de conhecimento, que subestimam e desrespeitam os profissionais.
Para Keila, manter-se sereno e equilibrado frente a situações conflitantes no condomínio é bastante desafiador, mas fundamental para exercer uma boa gestão. Ela lista algumas atitudes estratégicas para fortalecer a inteligência emocional:
A psicóloga Wanda Sanchez Peters aconselha fortemente: não tenha embates.
“Numa relação hierárquica, ou qualquer relação, tem que ter um adulto. E um adulto que conduza uma determinada situação no papel de administrador ou síndico. Quem conduz é quem faz as perguntas. Por exemplo, frente a uma acusação, pergunte onde o condômino tóxico obteve tal fato, desde quando, por que isso aconteceu, como viu, se é a primeira vez que vê, enfim, questionar a situação para que a pessoa perceba o caráter infundado, e as pessoas percebam o caráter infundado daquela acusação”.
Em outras palavras, ela resume, preferir a argumentação é o melhor caminho. Sem aceitar provocações e ficar muito abalado em decorrência de ser atacado por esse tipo de pessoas tóxicas. Dentro do possível, não dar tanta importância ou tratar a situação até como uma certa indiferença.
“Não existe ainda uma matéria na escola que ensine as pessoas a viver em sociedade, ter cidadania e respeito. É uma questão grave e as estatísticas mostram com aumento de depressão e ansiedade, por falta de respeito, empatia, compaixão, que é uma doença muito grave da nossa sociedade. Seria muito interessante se mais escolas, mais instituições promovessem essa cidadania dentro de uma cadeira, não só tecnicamente, mas que tivesse uma pauta voltada para isso”, afirma Wanda.
A administradora pode ser uma aliada do síndico na missão de despertar os omissos e neutralizar os tóxicos.
“Ela é o grande braço direito do condomínio e real assessora do síndico, como principal especialista da relação. Digo isso pela experiência acumulada com diversos clientes de diferentes perfis que uma administradora possui”, conta Keila, que também é administradora.
É fato concreto que, quando a massa condominial se movimenta em prol do condomínio, ela neutraliza os tóxicos, e isso só é possível com envolvimento e participação. E contar com aliados é fundamental para fortalecer a gestão.
Fontes entrevistadas: Keila Silva (síndica profissional e administradora), Pâmela Brusco (síndica profissional) e Wanda Sanches Peters (psicóloga).