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Alexandre Marques

Entenda o racismo estrutural em condomínios

Advogado provoca reflexão sobre o tema e de que maneira ele se mostra na massa condominial

07/07/20 01:31 - Atualizado há 1 ano
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Advogado provoca reflexão sobre o tema e de que maneira ele se mostra na massa condominial

Por Alexandre Marques*

Desde a morte de George Floyd (25/05/2020), por um policial americano branco, testemunhando a maior onda de protestos nos Estados Unidos desde o assassinato do líder negro Martin Luther King Jr em 1968. Protestos que se espalharam pelo mundo afora, inclusive no Brasil. 

País de passado escravagista que tem muito que se desculpar, compensar e viabilizar aos milhões de cidadãos pretos que fazem dele uma nação. 

Aliás, além dos pretos ou pardos que assim se identificam nos censos do IBGE, temos que lembrar que a maioria da população que se identifica de outra forma, carrega em seus genes componentes da raça negra. 

A ideia desse texto não é discutir ou dissecar os séculos de opressão, escravidão, suas motivações e consequências, para isso, precisaríamos de muitas e muitas páginas de reflexão e, como se sabe, já existe farto material feito por sociólogos, antropólogos, filósofos e historiadores (pretos, inclusive) que discorrem com a propriedade e profundidade devida.

A ideia é falar do racismo estrutural nos condomínios. Você sabe o que quer dizer racismo estrutural? 

Racismo estrutural é o termo usado para reforçar o fato de que há sociedades estruturadas com base na discriminação, que privilegiam algumas raças em detrimento das outras. 

Você duvida que isso ainda ocorra no Brasil? Que tal pensar no seguinte: somos 55% de negros no País e 96% de nossos representantes parlamentares são brancos. 

Apenas 17% da população negra enquadra-se nas definições do IBGE de “ricos”, enquanto 3/4 da população miserável é de negros ou pardos. 

Além disso, os mais afetados pela COVID-19 são negros, aliás, uma das primeiras vítimas fatais do coronavírus no Brasil era preto (porteiro aposentado Manoel Messias Freitas Filho, 62). 

No último dia 22/06, assisti ao Roda Vida, tradicional programa de TV da Rede Cultura, que trouxe Silvio Almeida (jurista, filósofo com doutorado e pós-doutorado pela Faculdade de Direito da USP, professor da FGV, Mackenzie e da Universidade Duke na Carolina do Norte nos Estados Unidos, e autor do livro “Racismo Estrutural – Feminismos plurais”) para discorrer justamente sobre o assunto e seus nefastos efeitos no Brasil. 

O convidado apresentou uma visão contundente e incômoda sobre esse tema, sem perder o rigor científico ou soar agressivo, e, louve-me a refletir sobre a existência do racismo estrutural também nos condomínios.

Quantos condôminos pretos moram em seu condomínio? Já reparou nisso? Quantos síndicos orgânicos ou profissionais pretos você conhece? E advogados que militam nesta área? E donos de administradoras ou empresas terceirizadas de segurança patrimonial? 

Trabalho com condomínios há 30 anos e conheço pouquíssimos. Em um pouco mais de uma década participando como palestrante em congressos, encontros, debates e eventos voltados para o mercado condominial, vi menos de cinco palestrantes negros discorrendo sobre os mesmos temas. 

Qual a razão desta diferença de números? Não existem pessoas pretas querendo trabalhar nesse segmento? Não existem síndicos profissionais ou condôminos pretos querendo atuar em seus condomínios? Advogados pretos não tem interesse nesse mercado? Não, a resposta é outra! 

Como palestrante e professor (OAB/SP, AASP, FAAP e outras), vi muitas vezes pretos e pretas assistindo/participando ávida e ativamente das aulas. A pergunta é: será que o mercado de trabalho os prestigia ou os seleciona para os cargos? 

Você, morador de condomínio que lê essas breves linhas, contrataria um síndico profissional preto? 

Além deste viés, existe outro ainda mais cruel: a quantidade de condôminos (proprietários) negros. Moradores até existem alguns, pouquíssimos em condomínios, mas, condôminos, estes são raros, ainda mais em condomínios de padrão “A” ou “B”. E quando têm, ainda ouvimos dos demais moradores em assembleia: “Deve ser artista, jogador ou diretor de multinacional”

Como quase em tudo no Brasil, os negros têm pouquíssimo acesso à vida em condomínio, dada as dificuldades socioeconômicas impostas. 

Recente pesquisa do IBGE realizada na região metropolitana de São Paulo mostrou que menos de 1% (19,9% da população) de negros residem na região central da cidade de São Paulo. A maior parte reside na periferia, sendo a maioria da população neste caso.

E, quando residem, sofrem, por vezes, preconceito dentro de suas próprias casas, perpetrado de forma covarde por outros moradores. 

Em 2018, a estudante de Jornalismo Isabella Barboza foi abordada por dois homens antes de entrar em seu próprio apartamento no bairro de Pinheiros, bairro de classe média, na zona oeste da capital paulista. Constrangida, ela teve que responder – e provar – a eles que morava, sim, naquele prédio. O motivo para o constrangimento? Racismo, pois a jovem é negra.

Segundo a matéria: “O episódio aconteceu em um bairro onde, de acordo com o IBGE, apenas 7% dos moradores são negros. Porcentagem oposta àquela encontrada em bairros periféricos do município de São Paulo – como Parelheiros, Grajaú, Jardim  ngela, Jardim São Luís, Cidade Tiradentes, Guaianazes, Itaim Paulista, Brasilândia e Anhanguera –, onde mais de 50% da população residente é preta ou parda”.

Até quando seremos coniventes, omissos e corresponsáveis por essa desigualdade também imperar nos condomínios? 

Na próxima vez que encontrar com uma pessoa preta nos corredores, halls sociais, elevadores, garagens, áreas comuns e de lazer de seu condomínio pense nisso antes de baixar os olhos, apertar a bolsa contra o corpo, perguntar se a pessoa reside no condomínio ou se está procurando algum morador e outras tantas atitudes como estas.  

Você deve estar pensando “que isso não é mais assim”, “que a jovem, por sua atitude deve ter levantado suspeitas”, “que você ATÉ DARIA oportunidade para um síndico profissional, administrador, advogado preto”, “que você não tem nada contra, até gosta deles”, enfim, muito cuidado!.

A falta de reconhecimento dos padrões subjetivos e intrínsecos do racismo existente em você é que constrói todos os dias uma sociedade racista! 

(*) Alexandre Marques é consultor, advogado militante e professor na área de direito condominial; Mestrando pela FADISP, Coordenador do curso de Pós-graduação em Direito Condominial da FAAP/SP, especialista em Processo Civil pela PUC-SP, com cursos de extensão em Direito Imobiliário e Direito Civil; membro da Comissão de Direito Condominial do IBRADIM (Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário), palestrante do Departamento de Cultura e Eventos da OAB-SP; coautor do Audiolivro: “Tudo o que você precisa ouvir sobre Locação” (Editora Saraiva) e Autor do livro “Legislação Condominial: aplicação prática”; articulista dos programas “Metrópole Imobiliário” da Rádio Metrópole FM; “Edifício Legal” da rádio CBN-RO , “A hora do povo” da rádio Capital-SP e “Dito e Feito” da Rádio Nacional; sócio-diretor da Alexandre Marques Sociedade de Advogados.

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