O que está por trás da CPI das HIS?
Síndicos e administradoras não podem permitir ou ignorar a locação por temporada de apartamentos em condomínios populares sob risco do condomínio ser corresponsável se houver conivência
Nos últimos meses, um tema tem ganhado força nos bastidores da política e do mercado imobiliário paulistano: a CPI das HIS - a Comissão Parlamentar de Inquérito criada pela Câmara Municipal de São Paulo para investigar possíveis irregularidades nas Habitações de Interesse Social (HIS).
Mas o que isso significa, na prática, para quem trabalha com condomínios, moradia ou administração predial?
A proposta inicial das HIS é nobre e essencial: garantir moradia digna para famílias de baixa renda, com incentivos e condições diferenciadas. Porém, como em muitos programas públicos, o problema começa quando o propósito se perde e o lucro fala mais alto.
A CPI surgiu justamente para investigar se há empreendimentos que, ao invés de cumprir essa função social, estão explorando comercialmente imóveis populares inclusive com locações de curta temporada, como se fossem flats ou via aplicativos.
Imagine o absurdo: prédios construídos com benefícios públicos, isenções e contrapartidas, sendo usados para hospedagem temporária. Isso distorce o objetivo social e cria uma nova camada de desigualdade — porque tira de famílias que precisam a oportunidade de ter um lar fixo, transformando o que era para ser “moradia” em “mercado”.
A CPI vem para jogar luz sobre isso. Ela quer entender quem ganhou com essas distorções, quais construtoras ou administradoras estão envolvidas e se o poder público fiscalizou corretamente.
É um movimento necessário, que toca em algo muito maior do que uma simples irregularidade: toca na responsabilidade social de quem constrói e administra a cidade.
Por que a CPI das HIS importa para síndicos e administradoras?
Porque a cultura da habitação responsável começa dentro dos condomínios. Entender o que é HIS, respeitar seus limites de uso e garantir que o prédio mantenha sua destinação correta é, também, um ato de cidadania.
Muitos empreendimentos estão sendo notificados justamente por permitir ou ignorar a exploração irregular de unidades — e o condomínio pode, sim, ser corresponsável se houver conivência.
O novo Decreto Municipal nº 64.244/2025, que proíbe a locação de curta temporada em imóveis HIS e HMP (Habitação de Mercado Popular), é mais um passo para recuperar o propósito desses programas.
E, sinceramente, era necessário. Porque enquanto alguns transformam o que é público em negócio, outros seguem esperando na fila por uma moradia digna.
Como síndica profissional, vejo que a discussão da CPI das HIS vai além da política: é sobre resgatar o sentido de moradia como direito, não como mercadoria. É sobre lembrar que cada apartamento desses representa uma história, um recomeço, uma promessa feita pelo Estado a quem mais precisa.
Se há uma CPI em andamento, é porque alguém desviou o caminho. Que ela sirva, então, para recolocar as coisas no lugar — com transparência, justiça e, principalmente, respeito à função social da moradia.
(*) Amanda Accioli é Síndica Profissional e Advogada Condominialista, Diretora Nacional da Sindicatura da ANACON (Associação Nacional da Advocacia Condominial), Membro da Comissão Especial de Direito Condominial da OAB/SP, Síndica associada à AABIC e ao Secovi-SP. Palestrante e articulista. Instagram: @acciolicondominial | e-mail: amandaaccioli.adv@gmail.com