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Zulmar Koerich

Exclusão do voto do inadimplente para quóruns qualificados

Há casos em que a taxa de inadimplência do condomínio se aproxima dos quóruns necessários para aprovação de uma obra, por exemplo, o que, segundo autor deste artigo, acaba impedindo a votação

06/04/21 12:48 - Atualizado há 3 anos
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Há casos em que a taxa de inadimplência do condomínio se aproxima dos quóruns necessários para aprovação de uma obra, por exemplo, o que, segundo autor deste artigo, acaba impedindo a votação

Por Zulmar Koerich*

O processo de tomada de decisões em um condomínio, por suas particularidades, deve observar alguns princípios, quais sejam:

  • i) participação (art. 1335, III do CC/2002), que diz respeito ao direito individual do condômino de integrar a construção das diretrizes e normas que regularão internamente a comunidade condominial, bem como definir os serviços, obras e seus custos;
  • ii) decisão colegiada, que fixa a competência da pluralidade dos indivíduos reunidos para decidir sobre determinadas matérias apontadas pela legislação e pela convenção, observando os respectivos quóruns (art. 1334, III, do CC/2002);
  • iii) representação, relacionado à capacidade de aqueles indivíduos reunidos serem considerados representantes do todo (art. 1352 do CC/2002);
  • iv) soberania das decisões, do qual decorre o poder de vincular a totalidade dos condôminos às decisões tomadas pelo colegiado (art. 24, § 1, da lei 4591/64). 

Assim sendo, a legitimidade das decisões tomadas pela assembleia decorre da sua competência de representação do todo. No dizer de VENOSA1: “A assembleia dos condôminos representa o poder legislativo do instituto condominial”, impondo-se indistintamente sobre adimplentes, inadimplentes e sobre aqueles que anuíram ou não com as decisões tomadas. 

Por sua vez, os quóruns estabelecidos pelo legislador e pela convenção constituem garantia mínima de representatividade, devendo, como um todo orgânico, coadunarem-se com os princípios acima assinalados, não podendo haver antagonismos autofágicos entre eles, mas complementariedade.

Posto isso, temos que o direito individual do condômino de participar e votar das decisões colegiadas está condicionado à situação de adimplemento quanto a suas obrigações, a teor do que preconiza o art. 1335, III, do Código Civil:

Art. 1.335. São direitos do condômino: (...) III - votar nas deliberações da assembleia e delas participar, estando quite.

No dizer de Fábio Ulhoa Coelho2:

"O condômino que deixou de pagar qualquer contribuição, ordinária ou extraordinária, tem legalmente suspenso o direito de participar da assembleia de condomínio enquanto não emendar a mora, com os consectários legais. A suspensão atinge tanto o direito de participar das discussões dos temas constantes da ordem do dia (voz) como das deliberações que devem ser adotadas acerca deles (voto). Mesmo o condômino que discorda do pagamento de determinada parcela que lhe foi cobrada sofre a restrição nos direitos de voz e voto. Ele não pode simplesmente inadimplir a obrigação; se considera indevida a parcela, deve buscar em juízo a invalidação da cobrança.”

Resta estreme de dúvidas que ao condômino inadimplente não é dado o direito de participar, ou seja, de opinar, refutar opinião alheia, deliberar e decidir sobre a vida condominial, de forma que sua condição o impede de tomar parte do órgão colegiado, que atuará como representante da massa e imporá a decisão sobre a totalidade dos condôminos.

E aqui é o ponto fundamental para fixarmos as bases do entendimento de que o condômino inadimplente deve ser excluído do computo dos votos para fins de se alcançar a aprovação de determinada matéria por quórum qualificado: ele não pode influenciar nas decisões.

Imaginemos que um determinado condomínio, desejoso de realizar uma obra de embelezamento em seu hall de entrada, tenha submetido a matéria à deliberação pela assembleia.

Conforme disposição do Código Civil (art. 1341, I), o quórum para aprovação de uma obra voluptuária é de 2/3 dos condôminos. Entretanto, este mesmo condomínio possui uma inadimplência de mais de 1/3. Se considerássemos necessário que os 2/3 referidos pela norma incluíssem os inadimplentes, teríamos por prejudicada a votação. Neste caso hipotético, os inadimplentes teriam participação absoluta e decisiva, não havendo, além de aprovação da obra, a própria votação. 

Neste caso, o direito de participação dos condôminos adimplentes seria sumariamente tolhido pelos inadimplentes. Por certo, essa não foi a vontade do legislador, que é, em última análise, a de atender ao bem comum e trazer a paz social. Neste sentido, dispõe o art. 5 da Lei de Introdução ao Código Civil:

Art. 5º Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

Não nos parece correta a interpretação dada de que os dispositivos do Código Civil que tratam a respeito do quórum de votação não trazem a expressão “votos válidos” ou “votos dos adimplentes”, para fins de justificar a inclusão dos inadimplentes no cômputo da formação do quórum.

Trata-se, a nosso ver, de uma redundância. É como dizer “viajarei em um avião que voa”. O direito do inadimplente ao voto é inexistente, não dependendo de nova declaração além daquela capitulada no art. 1335, III, do Código Civil. O sistema normativo é um conjunto orgânico, cujos dispositivos se complementam e não se anulam.

Acerca do tema, em obra coordenada pelo ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal Cezar Peluso, chegou-se ao mesmo entendimento acima referido:

Resta saber se deve ser levado em conta, para composição global do quorum, o condômino impedido de votar. Não teria sentido que os inadimplentes, em razão de seu impedimento, inviabilizassem diversas deliberações relevantes para a vida condominial, como a realização de obras no edifício (art. 1.341), a alteração da convenção de condomínio (art. 1.351), [...]. Haveria duplo prejuízo aos condôminos pontuais, tanto por terem de adiantar a parte dos inadimplentes como por não conseguirem quórum para deliberações relevantes para a vida condominial. Sensato o entendimento de que diversos quoruns exigidos pelo Código Civil, como os acima referidos, sejam calculados sobre o número de condôminos aptos a votar, excluídos os inadimplentes (Código Civil Comentado: doutrina e jurisprudência. Coordenador Cezar Peluso – 7ª ed. rev. e atual. – Barueri, SP: Manole, 2013., p. 1.351 – grifou-se).  

Inobstante a inexistência de número considerável de julgados, podemos colacionar algumas decisões representativas que corroboram com o entendimento aqui perfilhado:

CONDOMÍNIO. ALTERAÇÃO DE CONVENÇÃO CONDOMINIAL. QUÓRUM. CONDÔMINOS INADIMPLENTES. Pretensão das autoras, condôminas, à anulação da nova norma condominial.

1. A exclusão dos condôminos inadimplentes da votação não pode obstar a configuração do quórum necessário à aprovação de alteração de Convenção, sob pena de impedir deliberações essenciais à administração do Condomínio. O melhor entendimento é aquele que considera, para o estabelecimento do quórum, apenas os condôminos aptos a votar.

2. Nota-se que apenas poderiam votar na assembleia impugnada vinte e dois moradores, do total de trinta. Estiveram presentes na assembleia quinze condôminos, que representam mais de 2/3 do quórum exigido para aprovação da alteração na convenção do Condomínio (art. 1.351, primeira parte, do CC). Assim, sob diversos enfoques, o aspecto formal da assembleia, pela qual houve a aprovação de nova Convenção, foi observado. [...] (TJ-SP - APL: 92517242820088260000 SP 9251724-28.2008.8.26.0000, Relator: Carlos Alberto Garbi, Data de Julgamento: 11/06/2013, 10ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/06/2013 – grifou-se).   DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. ANULATÓRIA. ASSEMBLÉIA GERAL EXTRAORDINÁRIA. CONDÔMINO INADIMPLENTE. DIREITO DE VOTO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. O Estatuto originário do condomínio réu prevê que o direito de voto (tanto para a Assembléia Geral Ordinária como para a Extraordinária) está condicionado à pontualidade do pagamento da contribuição condominial; razão pela qual, o quorum para deliberação deverá ser calculado sobre o número de condôminos aptos a votarem, excluídos os inadimplentes. [...] (TJ-DF - APC: 20080210060877, Relator: ALFEU MACHADO, Data de Julgamento: 28/01/2015, 3ª Turma Cível, Publicado no DJE: 09/02/2015 - grifou-se) APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONVALIDAÇÃO DE ASSEMBLÉIA GERAL EXTRAORDINÁRIA - DESTITUIÇÃO DE SÍNDICO - BENEFÍCIO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA - DEFERIMENTO - OBSERV NCIA DAS REGRAS ESTATUÍDAS PELA CONVENÇÃO CONDOMINIAL E PELA LEI N.º 4.591/64 - EXCLUSÃO DE VOTOS DE CONDÔMINOS INADIMPLENTES - QUORUM ATINGIDO - MULTA PELO DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL - REDUÇÃO PARA VALOR RAZOÁVEL - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO."(TJPR - 18ª C.Cível - AC 294619-6 - Curitiba - Rel.: Luiz Sérgio Neiva de Lima Vieira - Unânime - J. 07.07.2006 – grifou-se)

Por todo exposto, podemos concluir que a base de cálculo para compor os diversos quóruns qualificados de votação, previstos na legislação e convenção de condomínio, deve excluir os condôminos inadimplentes com suas obrigações.

1VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direitos Reais. 9 ed. São Paulo: Atlas S.A, 2009, 5 v

2 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2006, 4 v., 145-146.

(*) Zulmar Koerich é advogado especialista em condomínios que atua em Santa Catarina; autor de três livros “Condomínio Edilício - Aspectos Práticos e Teóricos”, “Manual para Síndicos, Membros de Conselho e Administradores em 323 perguntas e respostas”, e “Danos Morais nos Tribunais”; pós-graduado em Direito Civil e Empresarial.

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