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André Junqueira

Os impactos do PL 1179/20 no universo condominial

PL, que ainda será votado, é uma tentativa de manter a ordem mundial diante do coronavírus

01/04/20 03:42 - Atualizado há 4 anos
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PL, que ainda será votado, é uma tentativa de manter a ordem mundial diante do coronavírus

Por André Junqueira*

A situação sem precedentes modernos de mobilização da sociedade mundial continua gerando desafios imensos da comunidade jurídica em adaptar a ordem mundial vigente à situação de quarentena, parcial ou total, para evitar a propagação do Coronavírus (COVID-19).

Uma dessas tentativas de adaptação é a pretendida pelo Projeto de Lei do Senado nº 1179 de 2020, de autoria do Senador Antonio Anastasia (PSD/MG) que cria o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do vírus mencionado.

O projeto merece uma profunda reflexão, pois são diversas as matérias por ele tratadas:

  • Prescrição/decadência (art. 3º do PL1179/2020)
  • Reuniões e assembleias de pessoas jurídicas de direito privado (artigos 4º e 5º)
  • Resilição, resolução e revisão dos contratos (artigos 6º e 7º)
  • Relações de consumo (art. 8º)
  • Locações de imóveis urbanos (artigos 9º e 10)
  • Contratos agrários (artigos 11 a 13)
  • Suspensão de prazos de aquisição pela usucapião de bens móveis e imóveis (art. 14)
  • Sociedades empresárias (artigos 18 a 20)
  • Regime concorrencial (art. 21)
  • Direito de família e sucessões (artigos 22 e 23)
  • Disposições sobre o Código de Trânsito Nacional e a Lei de Proteção de Dados, nesse último caso, atrasando sua data de vigência.

Apesar de louvável a iniciativa e as razões expostas pelo projeto, algumas de suas disposições parecem totalmente inadequadas. No entanto, esse artigo focará apenas em comentar os artigos 15, 16, 17 e 19, que afetam diretamente os condomínios edilícios.

Comentários sobre os artigos que tratam de condomínios

Poderes emergenciais para o síndico (art. 15).

O primeiro dos artigos que tratam de condomínios reza:

“Art. 15. Em caráter emergencial, além dos poderes conferidos ao síndico pelo art. 1.348 do Código Civil, compete-lhe:

I - restringir a utilização das áreas comuns para evitar a contaminação do Coronavírus (Covid-19), respeitado o acesso à propriedade exclusiva dos condôminos;

II – restringir ou proibir a realização de reuniões, festividades, uso dos abrigos de veículos por terceiros, inclusive nas áreas de propriedade exclusiva dos condôminos, como medida provisoriamente necessária para evitar a propagação do Coronavírus (Covid-19), vedada qualquer restrição ao uso exclusivo pelos condôminos e pelo possuidor direto de cada unidade.

Parágrafo único. Não se aplicam as restrições e proibições contidas neste artigo para casos de atendimento médico, obras de natureza estrutural ou a realização de benfeitorias necessárias.”

A inovação está em harmonia com o que a ampla maioria dos juristas têm defendido a respeito do poder excepcional do síndico de restringir o uso de áreas comuns para evitar a propagação da doença mediante aglomerações ou rotatividade que exponha os demais a risco. Conforme já publicado em artigo anterior

Porém, a redação do parágrafo único não parece ser a mais acertada, ao mencionar “obras de natureza estrutural ou a realização de benfeitorias necessárias” foi suprimida o mais importante adjetivo: urgente

Mesmo obras e benfeitorias necessárias, sejam comuns ou exclusivas, podem ser postergadas pela conveniência e, nesse caso, segurança ou saúde.

Além disso, obras necessárias, mas não urgentes, podem ser objeto de restrição, como redução de pessoas que trabalham para reduzir a rotatividade e aglomeração. Mais adequado seria simplesmente citar que não se aplicam tais restrições e proibições para obras e benfeitorias urgentes, mantendo casos de atendimento médico.

Como a essência do projeto é “emergencial e transitória” que se posterguem quaisquer atividades que no momento contribuam para a propagação e contágio da moléstia.

Assembleias e votações por meios virtuais (art. 16)

O ponto de maior controvérsia provavelmente se localiza no artigo 16, reproduzido a seguir:

“Art. 16. A assembleia condominial, inclusive para os fins dos arts. 1.349 e 1.350 do Código Civil, e a respectiva votação poderão ocorrer, em caráter emergencial, por meios virtuais, caso em que a manifestação de vontade de cada condômino por esse meio será equiparada, para todos os efeitos jurídicos, à sua assinatura presencial.”

Como mencionado em artigo anterior, nossa opinião é de que uma assembleia virtual ou parcialmente virtual é perfeitamente viável juridicamente e, sob certo ponto de vista, o artigo 16 é benéfico porque deixa clara tal possibilidade.

No entanto, algumas críticas se fazem necessárias. Em primeiro lugar, não se deve ignorar que já existem condomínios que fazem assembleias virtuais ou híbridas e o projeto dá a entender que seria uma novidade. Realmente não deixa de ser uma inovação para a esmagadora maioria, mas não todos os condomínios. 

Em segundo lugar, seria importante deixar claro o principal requisito para que um condômino participe e vote virtualmente: que seja identificado de forma inequívoca.

Para contornar os dois pontos acima mencionados, bastaria inserir na norma que “independente de regulamentação prévia, a assembleia poderá ocorrer em meio virtual. E, em relação ao outro, que o condômino terá sua participação virtual equiparada à presencial desde que identificado de forma clara, seja via assinatura digital, certificação eletrônica, transmissão de áudio e vídeo etc.

E, em terceiro lugar e mais importante, deixar clara a participação virtual e não apenas o voto, harmonizando com o disposto no artigo 19 e com o direito assemblear. Segue texto do artigo 19 do projeto:

“Art. 19. As assembleias e reuniões referidas no art. 17 poder-se-ão realizar de forma remota, com a possibilidade de participação e votação virtual, por meio da rede mundial de computadores (internet).” (grifa-se)

O direito assemblear consiste em não apenas votar, mas sim, em tomar parte das discussões, argumentar, ter a oportunidade de convencer os demais. Sem essa parcela significativa do direito do condômino previsto no art. 1.335, III, do Código Civil, sob nossa ótica, haverá prejuízo imensurável.

Para neutralizar essa fragilidade do texto proposto, é suficiente a inclusão da palavra participação em conjunto do voto. Apenas para manter a redação coerente, até porque, como ventilado, o artigo 19 já faz menção à participação e voto.

Obrigação de prestação de contas do síndico (art. 17)

Causa certa surpresa a redação do artigo 17 do projeto de lei: 

“Art. 17. É obrigatória, sob pena de destituição do síndico, a prestação de contas regular de seus atos de administração.”

Melhor seria se esse artigo 17 não fosse inserido no Regime Jurídico Emergencial, pois o art. 1.348, VIII, do Código Civil, já determina a obrigação do síndico prestar contas de seus atos à assembleia, anualmente ou quando exigidas, esse dever, bem como todos os demais, continuam, como se conclui da interpretação do artigo 15 mencionado.

O descumprimento de qualquer dos seus deveres, incluindo a prestação de contas, é causa para destituição, conforme já previsto no art. 1.349 do Código Civil.

É plenamente compreensível que o interesse do legislador tenha sido o de ratificar o dever do síndico e que o momento que a sociedade passa não é uma “carta branca” para que ele cometa excessos em nome da prevenção e combate à pandemia. 

Contudo, entendemos que essa disposição poderá ser interpretada como redução do prazo de prestação de contas ou, pior, que outros deveres do síndico não mais seriam exigidos em tão nebuloso período.

Prorrogação do prazo de realização de assembleias e/ou mandato (art. 18)

Na leitura do inteiro teor do Projeto de Lei 1179 de 2020, nota-se a ausência de previsão semelhante ao artigo 18 para os condomínios edilícios. Para as sociedades empresárias, na seção de dilação de assembleias e reuniões, se propôs o seguinte:

“Art. 18. Todos os prazos legais para a realização de assembleias e reuniões de quaisquer órgãos, presenciais ou não, e para a divulgação ou arquivamento nos órgãos competentes das demonstrações financeiras pelas pessoas físicas ou jurídicas que exerçam atividade empresarial, ficam prorrogados até 30 de outubro de 2020”.

De fato, melhor seria que a redação abrangesse também os condomínios, pois, mesmo que se façam assembleias de eleição de síndico pela via remota, produzindo uma ata de assembleia, ao lidar com terceiros, como instituições financeiras e órgãos da administração pública, ainda se exige costumeiramente registro em cartório de títulos e documentos.

Em outras palavras, os condomínios têm a mesma necessidade das sociedades empresárias nesse sentido e foram esquecidos no projeto. Grave será a situação onde o condomínio sequer conseguirá utilizar seus próprios recursos financeiros por conta dos bancos não mais aceitarem em razão do mandato “expirado” do síndico.

Tamanha é a importância de se solucionar esse problema que, ao longo do mês de março, entidades como Secovi-Rio, ABADI, CRA-RJ e a Subseção de Niterói da OAB-RJ, só para citar alguns, enviaram ofícios para o Banco Central e a FREBRABAN se sensibilizarem com o assunto.

É imperioso que seja inserida disposição de que os mandatos já vencidos dos membros da administração do condomínio são automaticamente prorrogados até 30 de outubro de 2020 ou a realização da próxima assembleia, o que vier antes.

Conclusão

Tendo em vista o exposto, com a devida vênia, conclui-se que a melhor redação para os artigos que tratam de condomínios seria:

Art. 15. Em caráter emergencial, além dos poderes conferidos ao síndico pelo art. 1.348 do Código Civil, compete-lhe:

I - restringir a utilização das áreas comuns para evitar a contaminação do Coronavírus (Covid-19), respeitado o acesso à propriedade exclusiva dos condôminos;

II – restringir ou proibir a realização de reuniões, festividades, uso dos abrigos de veículos por terceiros, inclusive nas áreas de propriedade exclusiva dos condôminos, como medida provisoriamente necessária para evitar a propagação do Coronavírus (Covid-19), vedada qualquer restrição ao uso exclusivo pelos condôminos e pelo possuidor direto de cada unidade.

Parágrafo único. Não se aplicam as restrições e proibições contidas neste artigo para casos de atendimento médico, obras e benfeitorias necessárias e urgentes. (grifa-se a parte modificada)

Art. 16. A assembleia condominial, inclusive para os fins dos arts. 1.349 e 1.350 do Código Civil, a participação dos condôminos e a respectiva votação poderão ocorrer, em caráter emergencial e independente de regulamentação prévia no condomínio, por meios virtuais, caso em que a manifestação de vontade de cada condômino por esse meio será equiparada, para todos os efeitos jurídicos, à sua assinatura presencial, desde que a identificação do condômino seja inequívoca, conforme ferramenta de tecnologia definida pelo condomínio. (grifam-se as partes modificadas)

Art. 17. É obrigatória, sob pena de destituição do síndico, a prestação de contas regular de seus atos de administração. (tachado trecho a ser removido)

Art. 17. Os mandatos já vencidos dos membros da administração do condomínio são automaticamente prorrogados até 30 de outubro de 2020 ou a realização da próxima assembleia, o que vier antes. (grifa-se a parte substituída)

Por fim, sem prejuízo das críticas expostas, opinamos que o projeto de lei é positivo para o segmento condominial, permitindo que advogados e juízes tenham mais fundamento legal para justificar suas orientações e decisões, respectivamente.

Confira nosso Guia completo sobre o coronavírus e os condomínios AQUI.

(*) André Luiz Junqueira é professor, advogado com mais de 14 anos de experiência e autor do livro “Condomínios – Direitos & Deveres” (www.andreluizjunqueira.com.br). Pós-graduado em Direito Civil e Empresarial pela Universidade Veiga de Almeida (UVA). MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getulio Vargas (FGV). Certificado em Negotiation and Leadership pela Universidade de Harvard (HLS). Professor convidado da Escola Superior de Advocacia (ESA) da OAB/RJ, SECOVIRio, ABADI, ABAMI e GáborRH. Membro da Comissão de Direito Urbanístico e Imobiliário (CDUDI) da OAB/RJ. Membro da Comissão de Turismo (CT) da OAB-RJ. Membro e ex-diretor jurídico da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário (ABAMI). Conselheiro do Núcleo de Estudo e Evolução do Direito (NEED). Colunista dos portais SíndicoNet e Universo Condomínio. Sócio titular da Coelho, Junqueira & Roque Advogados e representa cerca de 10% dos condomínios do Rio de Janeiro. www.junqueiraeroqueadvogados.com.br / contato@andreluizjunqueira.com.br.

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